"E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito". (Romanos 8:28)
Muitos filhos de Deus têm, através dos séculos, tirado força e conforto desse abençoado versículo. Em meio a provações, perplexidades e perseguições, ele tem sido uma rocha sob seus pés. Embora aparentemente tais coisas parecessem trabalhar contra seu bem, ainda que para a razão carnal tais coisas parecessem estar a operar para seu sofrer, no entanto, a fé sabia que era justamente para o contrário. E como é grande a perda para aqueles que falharam em descansar sobre esta inspirada declaração: que dúvidas e temores são desnecessários; essa é a consequência.
"...todas as coisas contribuem". O primeiro pensamento que nos ocorre é este: Que glorioso Ser é nosso Deus, capaz de fazer todas as coisas acontecerem assim! Que há uma quantidade assustadora de mal em constante atividade. Que há um número quase infinito de criaturas que existem no mundo. Que há uma quantidade incalculável de oposição aos próprios interesses. Que há um exército enorme de rebeldes lutando contra Deus. Que há hostes de criaturas espirituais em oposição ao Senhor. E, ainda assim, bem acima de tudo, está DEUS, em uma calma imperturbável, com total controle da situação. Lá, do trono de Sua exaltada majestade, Ele faz todas as coisas segundo o conselho da Sua própria vontade (Efésios 1:11). Tememos, pois, diante deste, em cujos olhos "Todas as nações são como nada perante ele; ele as considera menos do que nada e como uma coisa vã" (Isaías 40:17). Em reverente adoração diante deste "Alto e o Sublime, que habita na eternidade" (Isaías 57:15) levante seu louvor a Ele, que do mal pode induzir o bem maior. "Todas as coisas contribuem". Na natureza não há tal coisa como um vácuo, e não há uma criatura de Deus que não sirva a seu propósito planejado. Nada é sem serventia. Tudo é energizado por Deus, de modo a cumprir sua missão pretendida. Todas as coisas estão trabalhando em direção a grande finalidade do prazer de seu Criador: todos são movidos em Sua vontade imperativa.
"Todas as coisas contribuem". Elas não só operam, elas cooperam; todas elas atuam perfeitamente como em um concerto, ainda que nenhuma sozinha, mas o ouvido ungido pode pegar os acordes de sua harmonia. Todas as coisas cooperam, não isoladas, mas em conjunto, como causas adjuntas e ajudas mútuas. É por isso que raramente as aflições vêm solitárias e sozinhas. Nuvem vem sobre nuvem: tempestade sobre tempestade. Tal como foi com Jó, um mensageiro da desgraça foi rapidamente sucedido por outro, carregado com notícias de tristeza ainda mais pesadas. No entanto, até mesmo aqui a fé pode rastrear tanto a sabedoria e o amor de Deus. É a composição dos ingredientes da receita que constitui o seu valor benéfico. Assim é com Deus: Suas dispensações não só "contribuem", mas "contribuem juntamente". Assim reconheceu o doce cantor de Israel - "Enviou desde o alto, e me tomou; tirou-me das muitas águas"(Sl 18:16). "Todas as coisas contribuem juntamente para o bem", etc. Estas palavras ensinam aos crentes que não importa o número nem o quão terrível é a característica das circunstâncias adversas, todas elas estão contribuindo para conduzi-los para a posse da herança prevista para eles no céu.
Quão maravilhosa é a providência de Deus em dominar as coisas mais desordenadas e em voltar para nosso bem as coisas que em si são as mais perniciosas! Nos maravilhamos com Seu grande poder que detém os corpos celestes em suas órbitas; nos maravilhamos com a contínua periodicidade das estações e a renovação da terra; mas isso não é tão maravilhoso quanto tirar o bem do mal em todas as complicadas ocorrências da vida humana, e até mesmo o poder e a malícia de Satanás, com a natural tendência destrutiva de suas obras, para ministrar o bem para seus filhos. "todas as coisas contribuem juntamente para o bem". Assim deve ser por três motivos. Primeiro, porque todas as coisas estão sob o controle absoluto do governador do universo. Segundo, porque Deus quer o nosso bem, e nada mais do que o nosso bem. Terceiro, porque mesmo o próprio Satanás não pode tocar um fio de cabelo de nossa cabeça sem a permissão de Deus, e somente para promover o nosso bem. Nem todas as coisas são boas em si mesmas, nem em suas tendências, mas Deus faz todas as coisas contribuem para o nosso bem. Nada entra na nossa vida por acaso: nem existem quaisquer casualidades. Tudo está sendo movido por Deus, com este fim em vista, o nosso bem. Tudo está sendo subserviente ao propósito eterno de Deus; as abençoadas obras para aqueles marcados em conformidade com a imagem do Primogênito. Todo o sofrimento, tristeza, perda, são usados por nosso Pai para ministrar em benefício dos eleitos.
"... daqueles que amam a Deus". Esta é a maior característica distintiva de cada cristão verdadeiro. O inverso marca todos os não regenerados. Mas os santos são aqueles que amam a Deus. Seus credos podem diferir em detalhes menores; suas relações eclesiásticas podem variar na forma exterior; seus dons e graças podem ser muito desiguais; ainda, neste particular, há uma unidade essencial. Todos acreditam em Cristo, todos amam a Deus. Eles o amam pelo dom do Salvador: eles o amam como um Pai em quem podem confiar: eles o amam por Suas excelências pessoais - Sua santidade, sabedoria, fidelidade. Eles O amam por Sua conduta: por aquilo que Ele retém e por aquilo que Ele concede: por aquilo que Ele repreende e por aquilo que Ele aprova. Eles amam mesmo pela vara que disciplina, sabendo que Ele faz todas as coisas bem. Não há nada em Deus, e não há nada de Deus, para que os santos não o amem. E disso, eles estão todos assegurados, "Nós o amamos porque ele nos amou primeiro".
"... daqueles que amam a Deus". Mas, infelizmente, eu amo a Deus tão pouco! Eu luto com tanta frequência com a minha falta de amor, e repreendo-me pela frieza do meu coração. Sim, há muito amor próprio e o amor do mundo, que às vezes eu questiono seriamente se eu tenho qualquer verdadeiro amor por Deus. Mas não é o meu verdadeiro desejo de amar a Deus um bom sintoma? Não é a minha verdadeira dor que eu o amo tão pouco uma evidência certa de que eu não o odeio? A presença de um coração duro e ingrato foi pranteado pelos santos de todas as eras. "Amar a Deus é uma aspiração celestial, que é sempre colocada em xeque pelos empecilhos e contenção da natureza terrena; e da qual não deve ser desvinculada até a alma ter feito a sua fuga do corpo vil, e clareado o seu caminho para o reino da luz e da liberdade "(Dr. Chalmers).
"... daqueles que são chamados". A palavra "chamado" nunca é, nas Epístolas do Novo Testamento, aplicada àqueles que são os destinatários de um simples convite externo do Evangelho. O termo sempre significa uma chamada interior e eficaz. Era uma chamada sobre a qual não tivemos controle, tanto em sua aparição quanto em tentar frustrá-la. Assim, em Romanos 1:6,7 e muitas outras passagens: " Entre as quais sois também vós chamados para serdes de Jesus Cristo. A todos os que estais em Roma, amados de Deus, chamados santos: Graça e paz de Deus nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo".
Esse chamado atingiu você, meu leitor? Ministros chamaram você: o Evangelho chamou, a consciência chamou, mas tem o Espírito Santo chamado com uma chamada interior e irresistível? Você foi espiritualmente chamado das trevas à luz, da morte à vida, do mundo à Cristo, de si para Deus? É uma questão da maior importância você saber se foi verdadeiramente chamado por Deus. Tem, então, a emoção, que dá vida a música dessa chamada soado e ecoado por todas as câmaras de sua alma? Mas como posso ter certeza de que eu recebi esse chamado? Há uma coisa aqui, no nosso texto, que deverá permitir-lhe determinar. Aqueles que foram chamados eficazmente, amaram a Deus. Ao invés de odiá-lo, eles agora o estimam; em vez de fugir dele aterrorizados, agora eles O buscam; em vez de não se importarem se a sua conduta O honraria, seu mais profundo desejo agora é O agradar e O glorificar.
"... segundo o seu propósito". A chamada não é de acordo com os méritos dos homens, mas de acordo com o propósito divino: "Que nos salvou, e chamou com uma santa vocação; não segundo as nossas obras, mas segundo o seu próprio propósito e graça que nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos dos séculos" (2 Tm 1:9.). O intento do Espírito Santo em trazer esta última cláusula é mostrar que a razão pela qual alguns homens amam a Deus e outros não deve ser atribuída apenas à soberania de Deus: não é por qualquer coisa especial neles, mas devido somente à Sua graça distintiva. Há também um valor prático nesta última cláusula. As doutrinas da graça são destinadas a um propósito a mais do que o de fazer-se um credo. Um dos principais é mover os afetos, e mais especialmente despertar esse carinho para que o coração oprimido, com medo, ou sobrecarregado com os cuidados, é totalmente insuficiente - até mesmo o amor de Deus. Para que este amor possa fluir perenemente de nossos corações, deve haver uma constante recorrência para quem o inspirou e que é estimado para aumentá-lo; assim como para reacender a sua admiração por uma bela cena ou imagem, você voltaria novamente para olhar sobre ela. É neste princípio que tanta força é colocada nas Escrituras em manter as verdades que acreditamos na memória: "Pelo qual também sois salvos se o retiverdes tal como vo-lo tenho anunciado" (1 Cor 15:02). "... as quais desperto com exortação o vosso ânimo sincero", disse o apóstolo (2 Ped. 3:1). "Fazei isto em memória de mim", disse o Salvador. É, então, voltando na memória para aquela hora, quando, apesar da nossa miséria e indignidade absoluta, Deus nos chamou, que a nossa afeição será mantida viva. É por recordar a maravilhosa graça que, então, estendeu a mão para um pecador merecedor do inferno e arrebatou-lhe como um tição do fogo, que seu coração vai ser retirado em adoração e gratidão. E é por descobrir isso que se deve apenas ao soberano e eterno "propósito" de Deus que você foi chamado quando tantos outros foram desconsiderados, que o seu amor por Ele será aprofundado. Voltando às palavras de abertura do nosso texto, encontramos o apóstolo (como expressando a experiência normal dos santos) declara: "sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem".
Isto é algo mais do que uma crença especulativa. Que todas as coisas contribuem para o bem é ainda mais do que um desejo ardente. Não é que nós só esperamos que todas as coisas assim contribuam, mas que estamos plenamente assegurados que todas as coisas assim contribuem. O conhecimento que se fala aqui é espiritual, não intelectual. É um conhecimento enraizado em nossos corações, que produz confiança na verdade da mesma. É o conhecimento da fé, que tudo recebe da mão benevolente da Sabedoria Infinita. É verdade que não obtemos muito conforto deste conhecimento quando estamos fora da comunhão com Deus. Nem vai nos sustentar quando a fé não está em operação. Mas quando estamos em comunhão com o Senhor, quando em nossas fraquezas nos inclinamos para Ele, então é esta a nossa bendita segurança: "Tu conservarás em paz aquele cuja mente está firme em ti; porque ele confia em ti" (Isaías 26:3). Uma exemplificação marcante do nosso texto é fornecida pela história de Jacó - alguém que em vários aspectos cada um de nós se assemelha. Uma nuvem densa e escura veio sobre ele. O teste foi severo, e o medo estremeceu a sua fé. Seus pés quase que se desviaram. Seu triste lamento: "Então Jacó, seu pai, disse-lhes: Tendes-me desfilhado; José já não existe e Simeão não está aqui; agora levareis a Benjamim. Todas estas coisas vieram sobre mim" (Gênesis 42: 36). E ainda aquelas circunstâncias, que para os olhos ofuscados de sua fé usavam um tom tão sombrio, estavam naquele momento desenvolvendo e aperfeiçoando os eventos que se derramariam em torno da noite de sua vida o halo de um sol glorioso e sem nuvens. Todas as coisas estavam contribuindo para o bem dele! E assim, alma atribulada, as "muitas tribulações" logo passarão, e como você entrará no "reino de Deus" então verá, não mais "através de um vidro escuro", mas à luz do sol sem sombra a presença divina, que "todas as coisas" "contribuem juntamente" para o seu pessoal e eterno bem.
Traduzido por Edimilson de Deus Teixeira
Fonte: Comfort for Christians de A.W. Pink (leia aqui a biografia do autor)