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quarta-feira, 16 de julho de 2014

A PALAVRA DE DEUS NA VIDA E NA MISSÃO DA IGREJA

“A palavra de Deus é viva, é realizadora, mais afiada do que toda a espada de dois gumes: ela penetra até onde se dividem a vida do corpo e a do espírito, as articulações e as medulas e é capaz de distinguir as intenções e os pensamentos do coração”  (Heb 4,12).
Toda a história da salvação é uma prova de como a Palavra de Deus é viva. Quem toma a iniciativa de se comunicar é Deus, fonte da vida (cf. Lc 20,38). A sua Palavra dirige-se ao homem, obra das suas mãos (cf. Job 10,3), criado precisamente para ser capaz de Lhe responder, entrando em comunicação com o seu Criador. Portanto a Palavra de Deus acompanha o homem desde a criação até ao fim da sua peregrinação sobre a terra. Manifestou-se de diversos modos, atingindo o ápice no mistério da Encarnação, quando, por obra do Espírito Santo, o Verbo, Deus junto de Deus, se fez carne (cf. Jo 1,1.14). Jesus Cristo, morto e ressuscitado, é “o Vivente” (Ap 1,18), Aquele que tem palavras de vida eterna (cf. Jo 6,68).
A Palavra de Deus é também afiada. Ilumina a vida do homem, apontando-lhe o caminho a seguir, sobretudo através do Decálogo (cf. Ex 20,1-21), que Jesus sintetizou no mandamento do amor para com Deus e para com o próximo (cf. Mt 22,37-40). As Bem-aventuranças (cf. Lc 6,20-26) são, por sua vez, o ideal da vida cristã, vivida na escuta da Palavra de Deus que perscruta os sentimentos dos corações, inclinando-os para o bem e purificando-os do que é pecaminoso. Comunicando-Se ao homem pecador, que porém é chamado à santidade, Deus exorta-o a mudar o mau comportamento: “Convertei-vos dos vossos maus caminhos e guardai os meus mandamentos e preceitos, no cumprimento de toda a Lei que prescrevi aos vossos pais e vos comuniquei por meio dos meus servos, os profetas”  (2Reis 17,13). Também o Senhor Jesus dirige, no Evangelho, o convite: “Arrependei-vos, pois está perto o Reino dos Céus”  (Mt 3,2). Pela graça do Espírito Santo, a Palavra de Deus toca o coração do pecador arrependido e leva-o à comunhão com Deus na sua Igreja. A conversão de um pecador é motivo de grande alegria no céu (cf. Lc 15,7). No nome do Senhor ressuscitado, a Igreja continua a missão de pregar “a todas as nações o arrependimento e o perdão dos pecados”  (Lc 24,47). Ela mesma, dócil à Palavra de Deus, põe-se no caminho de humildade e de conversão, para ser cada vez mais fiel a Jesus Cristo, seu Esposo e Senhor, e para anunciar, com mais força e autenticidade, a sua Boa Nova.
A Palavra de Deus é também eficaz. Comprovam-no as histórias pessoais dos patriarcas e dos profetas, bem como do povo eleito da Antiga e da Nova Aliança. De forma de todo excepcional, testemunha-o Jesus Cristo, Palavra de Deus que, encarnando, “veio habitar no meio de nós” (Jo 1,14), e que continua a anunciar o reino de Deus e a curar os enfermos (cf. Lc 9,2) através da sua Igreja. Esta realiza tal obra de salvação por meio da Palavra e dos Sacramentos, de modo especial a Eucaristia, fonte e cume da vida e da missão da Igreja, onde, pela graça do Espírito Santo, as palavras da consagração se tornam eficazes, transformando o pão no Corpo e o vinho no Sangue do Senhor Jesus (cf. Mt 26,26-28; Mc 14,22-23; Lc 22,19-20). A Palavra de Deus é, portanto, fonte da comunhão entre o homem e Deus e entre os homens que o Senhor ama.
A estreita relação entre Eucaristia e Palavra de Deus também contribuiu para a escolha do tema da próxima Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, reforçando o desejo, aliás antigo, de levar a reflexão sinodal a concentrar-se sobre a Palavra de Deus. Daí que, após o Sínodo dos Bispos sobre a Eucaristia fonte e cume da vida e da missão da Igreja, realizado de 2 a 23 de Outubro de 2005, parecesse lógico concentrar-se sobre a Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja, aprofundando ulteriormente o significado da única mesa do Pão e da Palavra. O tema reflecte o desejo prioritário das Igrejas particulares, que os Bispos, seus Pastores, manifestaram. Sim, porque a escolha do tema da próxima reunião sinodal foi feita de forma colegial. De acordo com uma praxe já consagrada, o Santo Padre Bento XVI tinha encarregado a Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos de consultar para o efeito todo o episcopado da Igreja Católica. Das respostas enviadas pelas Igrejas Orientais Católicas sui iuris, pelas Conferências Episcopais, pelos Dicastérios da Cúria Romana e pela União dos Superiores Gerais resultou ser a Palavra de Deus o tema preferido com diversas acentuações e notável variedade de aspectos. O abundante material foi analisado pelo XI Conselho Ordinário da Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos que, de certa forma, representa a inteira assembleia. Aliás, 12 dos seus membros foram escolhidos pelos colegas durante a XI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos. Em conformidade com o previsto no Ordo Synodi Episcoporum, outros 3 membros do Conselho foram nomeados por Sua Santidade o Papa Bento XVI. O resultado de um fecundo debate feito no Conselho Ordinário foi sintetizado numa terna de temas que o Exc.mo Mons. Secretário Geral submeteu à decisão do Sumo Pontífice.
O tema escolhido pelo Santo Padre, Presidente do Sínodo dos Bispos, foi tornado público a 6 de Outubro de 2006. A seguir, o Conselho Ordinário da Secretaria Geral empenhou-se na preparação dos Lineamenta, documento que tem por finalidade apresentar brevemente o estado da questão sobre o importante tema da Palavra de Deus, indicar aspectos positivos na vida e na missão da Igreja, sem omitir certos aspectos problemáticos ou que, pelo menos, carecem de um aprofundamento para bem da Igreja e da sua vida no mundo. Nesse sentido, os Lineamenta reportaram-se abundantemente à Constituição Dogmática sobre a divina revelação, a Dei Verbum, e de modo especial seguem a linha escolhida pelos Padres conciliares, a de se colocar em atitude de religiosa escuta da Palavra de Deus, para depois poder proclamá-la desassombradamente (cf. DV 1). A releitura em chave pastoral da Dei Verbum é acompanhada das sucessivas intervenções do Magistério da Igreja, a quem cabe interpretar de forma autêntica o sagrado depósito da fé contido na Tradição e nas Escrituras.
Para facilitar a reflexão e o debate do tema a nível de Igreja universal, o Documento é acompanhado de um pormenorizado Questionário relativo aos assuntos abordados em cada capítulo. Todos os organismos colegiais, acima mencionados, são convidados a responder ao dito Questionário até ao fim do mês de Novembro do presente ano de 2007. O Conselho Ordinário, com a ajuda de alguns válidos especialistas, estudará a referida documentação e ordenará a temática num segundo documento, tradicionalmente chamado Instrumentum laboris, que servirá de ordem do dia da XII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que terá lugar, se Deus quiser, de 5 a 26 de Outubro de 2008.
Desde o princípio, a Igreja vive da Palavra de Deus. Em Cristo, Verbo encarnado sob a acção do Espírito Santo, a Igreja é “como que sacramento ou sinal e também instrumento da união íntima com Deus e da unidade de todo o género humano” (LG 1). A Palavra de Deus é também o motor inesgotável da missão eclesial, tanto para os que estão perto como para os que estão longe. Obedecendo ao mandato do Senhor Jesus e entregando-se à força do Espírito Santo, a Igreja está, portanto, em permanente estado de missão (cf. Mt 28,19).
Seguindo o exemplo da Bem-aventurada Virgem Maria, humilde Serva do Senhor, o Sínodo pretende favorecer uma total redescoberta da maravilha da Palavra de Deus, que é viva, afiada e eficaz, no próprio coração da Igreja, na sua liturgia e na oração, na evangelização e na catequese, na exegese e na teologia, na vida pessoal e comunitária, bem como nas culturas dos homens, purificadas e enriquecidas pelo Evangelho. Deixando-se despertar pela Palavra de Deus, os cristãos serão capazes de responder a quantos lhes pedirem a razão da sua esperança (cf. 1Pe 3,15), amando o próximo não “por palavras e com a língua, mas por obras e em verdade” (1Jo 3,18). Realizando as boas obras, brilhará diante dos homens a sua luz, reflexo da glória de Deus, e todos louvarão o nosso Pai que está nos céus (cf. Mt 5,16). A Palavra de Deus, portanto, irradia sobre toda a vida da Igreja, qualificando também a sua presença na sociedade como fermento de um mundo mais justo e pacífico, livre de toda a espécie de violência e aberto à construção de uma civilização do amor.

“A Palavra do Senhor permanece eternamente. Esta é a Palavra que vos foi anunciada” (1Pe 1,25. A reflexão sobre o tema sinodal converte-se em humilde oração para que a redescoberta da Palavra de Deus ilumine cada vez melhor o caminho do homem na Igreja e na sociedade durante o percurso, não poucas vezes tortuoso, da história, enquanto com confiança se esperam “novos céus e uma nova terra, onde habitará a justiça” (2Pe 3,13). - http://www.vatican.va/roman_curia/synod/documents/rc_synod_doc_20070427_lineamenta-xii-assembly_po.html

Cons. Elder Pereira

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